quarta-feira, 24 de abril de 2013
Baudelaire - A cabeleira
Ó tosão a ondular até tua cintura
Ó cachos! Ó perfume a que o ócio é intenso!
Êxtase! Por povoar à tarde a alcova obscura,
Da saudade que tua cabeleira dura
Quero agita-la no ar como se agita um lenço!
A Ásia é toda langor e, como a África, radia
Mundo que a morte e o azul e a ausência em si se resume
Na tua solidão, floresta de especiaria!
Como outras almas vão a errar sobre a harmonia,
A minha ó meu amor, nada em teu perfume!
Eu irei muito além onde o homem a vibrar,
Seivosa planta, sob o ardor dos astros;
Fortes tranças, ah, sois ondas de navegar!
Conténs, mágico sonho, ébano feito mar,
De flâmulas e velas e remos e mastros
Ah, que belo é beber, num porto que ressoa,
Em grandes goles, o som, o aroma e a cor;
Porto em que a nave num mar de ouro aponta a proa,
E abrindo os braços seu sela abraça a coroa
De um céu puro em que freme o eterno calor.
Mergulhei a fronte, a que o amor torna vaga,
Neste sombrio oceano em que o outro é circunscrito,
E minha alma sutil e que o balanço afaga,
A fecunda preguiça, e para sempre, traga,
Pois que o ócio perfumado é acalanto infinito!
No pavilhão azul de trevas destinadas
Concedes-me a profunda a redonda amplidão;
Na borda penugenta, a das mechas torcidas,
Eu me embebedo a arder de essências confundidas
Que são de óleo de coco, almíscar e alcatrão.
E sempre a minha mão, nesta crina soturna,
Pérolas semeará, rubi, safira e jade
Para que nunca mais te cales, taciturna
És o oásis em que eu sonho a transbordante urna
Em que eu trago em volúpia, o vinho da saudade.
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