É comum a frase que o grande amor da vida de Virginia Woolf foi Vita Sackville-West, escritora também, mas que não alcançou a mesma fama. Orlando, uma das obras mais conhecidas dela foi escrita num período de descanso e descontração em que a autora usou sua “amante” como inspiração. Portanto, rumores, fatos, fofocas e tudo mais giram em torno desse caso extra conjugal de Virginia, como uma explicação de “já que ela e Leonard Woolf dormiam em quartos separados”. Mas é óbvio que o buraco é muito mais embaixo.
Porém, não quero me alongar nas paixões de Virginia Woolf, quero sim falar do verdadeiro grande amor da vida dela que, sem dúvidas, foi Leonard Woolf, seu marido, que estava ali todo o tempo, que aguentou todos os momentos difíceis e também viveu infinitas alegrias ao lado de sua mulher. Em sua carta suicida – para ele – Virginia Woolf escreve que “ninguém no mundo poderia ter sido mais feliz do que fomos”, e se isso não é frase que se diz para o grande amor da vida, eu não sei de mais nada.
E o caso é que Leonard Woolf também era escritor, porém o seu trabalho ficou ofuscado por Virginia Woolf, que era a grande artista da família. E não é de hoje que um pensamento fica rodando por aqui vez ou outra “você precisa pesquisar sobre ele”.
Pesquisei em sebos virtuais e nada encontrei sobre Leonard Woolf, o que me restou então foram os blogs internacionais, a Wikipedia e a Amazon (porque preciso ver “a cara” dos livros).
Vamos a um pequeno resumo: além de escritor e editor da Hogarth Press (editora que ele e Virginia Woolf compraram), Leonard Woolf também se destacava como teórico político. Nasceu em 25 de novembro de 1880, em Londres, tinha uma família grande (10 irmãos) e o seu pai era judeu. Teve uma excelente educação, que colaborou para suas amizades, que consequentemente o fizeram conhecer Virginia Woolf. Faleceu em 14 de agosto de 1969, foi cremado e suas cinzas jogadas no jardim de Monk’s House, assim como as cinzas de Virginia Woolf.
A lista dos livros que ele escreveu é grande, porém destaco dois: o primeiro “The Village in the Jungle”, de 1913, que Pablo Neruda, em seu livro “Confesso que vivi” (p. 93), afirmou que era:
“um dos melhores livros que jamais foram escritos sobre o Oriente: A village in the jungle, obra-prima da vida verdadeira e da literatura real, um pouco ou muito prejudicado pela fama da mulher de Woolf, nada menos que Virgínia Woolf, grande escritora subjetiva de renome universal.”
O segundo, que achei interessante depois de ler as informações da editora Persephone Book, que relançou o livro em 2013, é o The Wise Virgins, de 1914, um romance semi autobiográfico, com um personagem principal chamado Harry, um jovem em dúvidas sobre o futuro: cuidar dos negócios da família e se casar com uma moça “adequada” (mas sem brilho) ou frequentar círculos artísticos e se casar com uma mulher fascinante e inteligente. Já sabemos o final da história, porém, o que deve valer à pena na leitura, segundo o que li, é que Leonard Woolf tinha uma escrita tão honesta quanto de sua mulher, sem contar os comentários que afirmam o romance como intrigante e também: “uma comédia social; engraçado; perspicaz; altamente inteligente; e às vezes amargamente satírico, enquanto o desfecho dramático e emocional ainda mantém uma grande quantidade de seu poder de chocar.”
Então, durante o casamento de Virginia Woolf, o que percebo – de acordo com a minha leitura dos diários dela – é que Leonard Woolf era um grande companheiro e incentivador. A opinião dele importava muito para ela, em alguns trechos ela diz que realmente só a opinião dele que importa, pois ela o vê, além de uma grande pessoa, um maravilhoso intelectual. Em nenhum momento li palavras desconfortáveis sobre o relacionamento dos dois, o que revela a tranquilidade do casal. Diferente dos casos amorosos dela que sempre caminharam para o lado da admiração (paixão) e depois para a decepção. E também fica evidente a preocupação de Virginia com ele, em seu trabalho, suas vontades, etc. Sem dúvidas, foi o relacionamento mais sólido e duradouro que Virginia Woolf construiu. Ele, Leonard Woolf, fazia parte do que a sustentava em pé: a lucidez, a coragem, a inteligência, o amor à literatura, à Londres, tudo ligado de uma forma tão complexa que é impossível acreditar que ele era menos que um amor verdadeiro.
Porém houve o infeliz dia (28 de março de 1941) que Virginia Woolf decidiu por fim em sua própria vida. E se há uma pessoa que sentiu essa perda foi Leonard Woolf, afinal, foram 29 anos juntos.
A vida de Leonard Woolf depois de Virginia Woolf
Assim que a morte dela foi anunciada, Leonard recebeu muitas cartas, algumas o convidando para passear, tomar chá, para sair da tristeza que, naturalmente, o acompanhava. Mas ele achou um absurdo as pessoas o convidarem para tal enquanto a presença de sua mulher ainda reinava em Monk’s House. Ele rabiscou num papel:
“They said ‘Come to tea and let us comfort you.’ But it’s no good. One must be crucified on one’s own private cross.
It is a strange fact that a terrible pain in the heart can be interrupted by a little pain in the fourth toe of the right foot.
I know that V. will not come across the garden from the Lodge, and yet I look in that direction for her. I know that she is drowned and yet I listen for her to come in at the door. I know that this is the last page and yet I turn it over. There is no limit to one’s stupidity and selfishness.”
It is a strange fact that a terrible pain in the heart can be interrupted by a little pain in the fourth toe of the right foot.
I know that V. will not come across the garden from the Lodge, and yet I look in that direction for her. I know that she is drowned and yet I listen for her to come in at the door. I know that this is the last page and yet I turn it over. There is no limit to one’s stupidity and selfishness.”
O casal deixou combinado que no velório deles tocaria Beethoven, porém ele ficou tão emocionado durante a cremação que esqueceu de solicitar a música.
Nos meses após à morte de Virginia, Leonard continuou a morar em Monk’s House. Porém, tempos depois, decidiu voltar para Londres e retomar o trabalho como escritor e político: se tornou Doutor pela Universidade de Sussex, trabalhou no Partido Trabalhista, foi eleito membro da Royal Society of Literature.
E então ele se apaixonou por Trekkie Parsons, que era irmã de um amigo dele, e viveu uma mistura de paixão platônica (porque ela era casada) e uma grande amizade. Em uma carta para ela, Leonard Woolf afirma que Trekkie representava o que ele mais acreditava: “o valor da arte e das pessoas e das próprias relações com as pessoas.”
Leonard também deu inúmeras entrevistas para jornais, rádio e televisão, em que discutia, desde sua vida com Virgínia, o Grupo de Bloomsbury, e seus próprios pensamentos sobre o suicídio, doenças mentais, literatura e política.
Quando Leonard faleceu, em 14 de agosto de 1969, ele deixou a Trekkie todos os seus bens, incluindo os seus manuscritos e direitos de publicação. Mais tarde, ela transferiu tudo para a Universidade de Sussex.
fonte: http://livroecafe.com/2014/02/06/um-pouco-de-leonard-woolf/