domingo, 2 de novembro de 2008

Tennyson

Fútil o ganho para um rei nada útil,
na calma do lar, à beira de penhas áridas,
unido a uma idosa esposa, a impor e dispor
iníquas leis a uma raça selvagem
que come, e amealha, e dorme, e de mim nem sabe.
A mim não resta senão viajar: beberei
a vida até o fundo. Sempre desfrutei
da fartura, e com fartura sofri, junto àqueles
que me amavam com amor ímpar; e, em terra,
arrastado pela corrente, as chuvosas Híades
agitavam o lúgubre mar: ganhei nome:
para sempre vagando com coração ávido,
vi, possuí, e muito conheci; cidades de homens
e costumes, climas, conselhos, governos,
nunca com desprezo, mas honrado por todos;
e brindei o prazer da batalha com meus pares,l
ongínquo ressoar nos vales da Tróia dos ventos.
Sou parte de tudo que encontrei;
ainda que toda experiência seja um círculo
em que brilha o mundo inexplorado com margens,
que sempre se desfazem sempre que avanço.
Que triste é deter-se, chegar a um fim,
enferrujar, enrugar, não brilhar com o uso!
Assim como respirar, era a vida! Vida cheia de vida
e de tudo fica um pouco, e de tudo para mim
poucos vestígios: mas a cada hora é salvo
desse silêncio eterno, um pouco mais,
um portador de coisas novas, e vil seria
se apenas três sóis me prouvessem e amealhassem
e este espírito grisalho com ânsias
de alcançar a sabedoria como um astro que se funde
antes de irromper o último pensamento humano.
Este é meu filho, meu Telêmaco,
a quem deixo o cetro e a ilha —
meu bem-amado, capaz de consumar
este trabalho, apaziguar com mansa prudência
um rude povo, e brando, passo a passo,
submetê-lo ao que é útil e bom.
Irrepreensível ao máximo, pronto para a domínio
dos deveres públicos, decente para não fracassar
em missões delicadas, e contribuir
com a justa adoração aos deuses de minha casa
quando eu partir. Eu lido a minha; ele, a sua lida.
Ali em frente o porto; a nave infla suas velas:
ali a penumbra do vasto escuro dos mares. Meus marinheiros,
almas no duro esforço, forjam, e fazem comigo —
sempre com festivas boas-vindas tomaremos
o trono e o sol, resistindo com
livres corações, sem desfaçatez —, somos velhos.
A velhice mantém suas honras e esforços;
a morte tudo conclui: mas há algo no fim,
por fazer ainda uma tarefa nobre pode haver,
nem só homens indecorosos em luta com deuses.
Começam a piscar as luzes frente às rochas:
apaga-se o largo dia, a lenta lua sobe: em volta
o fundo gemido das múltiplas vozes. Venham,
amigos, não é tarde para buscar um novo mundo.
Desatracai e, postos em ordem, batam
os sonoros encaixes; pois é meu intento
navegar além de onde o sol se põe, e se banham
os astros ocidentais, até a morte.
Talvez aqueles vorazes golfos nos devorem,
Talvez venhamos a alcançar as Ilhas da Fortuna
e vejamos o grande Aquiles, nosso conhecido.
Ainda que muito esteja perdido, muito nos resta;
e ainda que perdida a força dos velhos dias
que movia céus e terras; somos o que somos;
uma coragem única nos corações heróicos,
débeis pelo tempo e pelo destino, mas persistente
sem lutar, achar, buscar, jamais render.

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