sábado, 16 de outubro de 2010

Oscar Wilde - O retrato de Dorian Gray (frag.)

"Há poucos de nós quem, ás vezes, não acordamos antes da aurora, tanto depois de uma destas noites sem sonhos que fazem alguém quase se enamorar da morte ou uma destas noites de horror e alegria desfigurada, quando pelas câmaras do cérebro vagam fantasmas masi terríveis do que a própria realidade e aptos com aquela vívida vida que espreita em tudo o que é grotesco e que empresta à arte gótica sua resistente vitalidade, esta arte sendo, pode-se imaginar, especialmente a arte daquelas mentes que foram pertubardas com a doença da imaginação. Aos poucos, dedos brancos surgem pelas cortinas e parecem tremer. Fantásticas sombras negras espalham-se pelos cantos do quarto e se aninham lá. Do lado de fora, há o eriçar dos pássaros entre as folhasou o som dos homens indo para o trabalho, ou o suspiro e o soluço do vento descendo a colina e vagueando pela casa silenciosa, embora temendo despertar os que dormem. Véu após véu de fina renda escurecida se ergue e, gradualmente, as formas e as cores das coisas lhes são devolvidas, e observamos a aurora refazer o mundo em seu padrão antigo. Os cansados espelhos retornam à sua vida de imitação. Os castiçais sem chama ficam onde os deixamos e ao lado deles se deita o livro lido pela metade que estivemos estudando ou a flor com seu cabo que usamos no baile, ou a carta que tememos ler, ou que lemos com muita frequência. Nada nos parece alterado. Além das sombras irreais da noite, retorna a vida que conhecíamos. temos de retomá-la de onde paramos e lá nos domina um terrível sentimento de necessidade pela continuidade de energia na mesma volta cansativa de hábitos estereotipados ou uma louca ânsia, pode ser, que nossas pálpebras se abram em alguma manhã para um mundo que fora renovado para o nosso prazer, na escuridão, um mundo no qual as coisas teriam formas e cores novas, e ser alterado ou ter outros segredos, um mundo no qual o passado teria um lugar pequeno, se algum, ou sobrevive, de qualquer forma, em uma forma inconsciente de dívida ou lamento, a lembrança mesmo da alegria tendo seu amargor e as memórias de prazer, sua dor.

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