terça-feira, 2 de novembro de 2010

Shelley - À Noite

I
’Spectro da Noite, célere atravessa
Os mares do Ocidente!
Das brumosas grutas do Oriente vem depressa,
De onde, enquanto o dia refulgente
Se alonga em solidão, tu teces sonhos
Os mais benévolos e os mais medonhos
– Vem, ó Noite envolvente!

II
Esconde teu vulto em manto sem cor,
Teus astros benfazejos!Venda os olhos do Dia
[com o negror
De teu cabelo, e exaure-o com teus beijos,
Depois toca a cidade, e a terra, e o mar,
Com teu condão de ópio, a apaziguar
– Noite de meus desejos!

III
Quando acordei e vi o amanhecer,
Eu suspirei por ti;
E quando vi o orvalho esvanecer,
O sol pesar sobre o mundo, e senti
Que o Dia demorava-se, cansado,
Tal qual um hóspede indesejado,
Eu suspirei por ti.

IV
Veio tua irmã, a Morte, e perguntou:
Tu me chamaste aqui?
Teu doce filho, o Sono, se achegou,
E entre suaves murmúrios ouvi:
Queres que me acomode ao lado teu?
Chamaste-me aqui? — Respondi-lhe eu:
Não, não chamei a ti!

V
A Morte? Só quando houveres morrido,
Em breve, ah, em breve –
O Sono? Quando tiveres partido.
Que não me venha o Sono, nem me leve
A Morte, e sim tu, Noite, ó bem-amada
– Vem súbita, vem célere, alada;
Teu vôo seja breve!

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