sábado, 12 de setembro de 2009

Mito de Perséfone

Plutão e Perséfone davam seu passeio habitual pelo Hades, quando Hermes chegou com um recado de Zeus:
- Plutão, deus do Hades! Zeus lhe envia uma mensagem, por meu intermédio.Pede ele, o Senhor do Olimpo, que deixe Perséfone voltar à companhia de sua mãe Deméter que, em seu intenso sofrimento, condenou a terra a uma aridez mortal.
Plutão soltou uma gargalhada.
- Imaginem só! Terá Zeus enlouquecido? O que o faz pensar que cederia a um pedido desta natureza?
- Apenas transmito o recado, Plutão. Não cabe a mim julgar os pensamentos de Zeus.
Plutão pensou, franziu a testa e cerrou os olhos negros. Depois falou:
- Pois diga a Zeus que jamais consentirei a partida de Perséfone.
Hermes já ia alçando voo quando foi detido pelo toque suave dos dedos de Perséfone em seu braço.
- Um momento, Hermes! Deixe-me falar com meu esposo - e, virando-se para Plutão: - Peço-lhe, Plutão, que me permita voltar à minha mãe. Ela sofre e seu sofrimento condenará o mundo a uma destruição inevitável. Além do mais Zeus lhe fez um pedido e não acho sábio de sua parte provocar a ira do supremos Senhor do Olimpo.
Plutão pensou um pouco. Antes de dizer alguma coisa, ofereceu a Perséfone uma semente de romã.Só depois que ela levou a semente aos lábios, ele disse:
- Muito bem. Vejo que é sábia e prudente, minha esposa. Permitirei, portanto, que permaneça oito meses com sua mãe. Contudo, os outros quatro meses deverá passar em minha companhia.
Perséfone então deixou o Hades em companhia de Hérmes e foi procurar Deméter. Encontrou-a escondida no templo, toda envolta em dor. Ao ver a filha, um sorriso iluminou seu rosto pálido. Abraçaram-se em silêncio e as lágrimas que verteram se entrenharam na terra, fertilizando-a. E o mundo tornou a florecer. A alegria voltou às planícies e ao coração dos homens.
Do Olimpo, Géia contemplava, feliz, o renascimento das plantas. Tudo era festa.
Deméter despediu-se dos homens para retornar à companhia dos deuses com sua filha. Antes, porém, chamou o rei Céleo e seu filho Triptólemo e ensinou a eles os ritos sagrados, que davam à terra a vitalidade suficiente para produzir. Eram os rituais de feritilidade, eram os mistérios de Elêusis.
Triptólemo seguiu pelo mundo no carro que Deméter lhe deu, puxado por dragões que corriam na terra e nos ares. Difundiu a arte da agricultura e ensinou aos homens como atrelar os bois à charrua, para melhor revolverem a terra. Fundou inumeras cidades, ensinou o povo a preparar o pão, sempre protegido por Deméter. Na cidade de Cítia, o rei Linco teve inveja de seus talentos com a terra e tentou matá-lo e tomar para si as artes do cultivo. Mas Deméter, sempre atenta, transformou-o num lince.
E o cultivo do trigo se espalhou pelo mundo.

Oito meses se passaram e Perséfone, jovem e feliz, já nem se lembrava do dia de seu retorno ao Hades. Mas, no momento certo, ao contato das vibrações da lua negra, a semente de romã que seu marido lhe dera para ingerir comelou a emitir a sinistra mensagem: "Chegou a hora de voltar ao Hades".
De algum ponto do seu interior, a mensagem subiu à sua consciencia e uma estranha agitação tomou conta de Perséfone. O sorriso se apagou de seu rosto e seus olhos se pregaram num ponto qualquer do infinito. Deméter, aflita, não compreendia bem a súbita mudança da filha.
- Mãe - disse enfim a moça -, chegou a hora de retornar ao meu mundo interno, ao convívio de meu esposo. Não posso mais ficar. Mas volto dentro de quatro meses. Não fique triste, minha mãe, e aguarde meu retorno.
Perséfone partiu e Deméter se recolheu novamente a seu templo. E, por quatro meses, a terra voltou a secar, o verde sumiu e as folhas ressecadas eram levadas pelo vento num imenso turbilhão, aguardando o retorno de Perséfone, quando tudo voltaria a florir novamente.


A barca de Caronte atracou, trazendo sua divina passageira. Plutão estendeu a mão e ajudou Perséfone a descer. Abraçou-a com calor.
- Venha minha amada, o Hades a espera.
Perséfone sorriu e olhou em volta. Ali estava seu reinado, seu mundo escondido da luz superfície, onde não lhe importava se a terra floria ou secava, se a mãe chorava ou sorria. Para ela, só existia a realidade da vida em seu interior.


VILLAS-BÔAS, Márcia. Olimpo A saga dos deuses. pags. 100-102.São Paulo: Ed. Siciliano, 1995

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